Entra em vigor o Marco Legal dos Seguros
A Lei 15.040/24, que instituiu o Marco Legal dos Seguros, entrou em vigor nesta terça-feira (10). A nova norma busca modernizar as regras de contratos de seguros para conferir mais segurança jurídica às transações.
A lei tem origem no Projeto de Lei 2597/24, do ex-deputado José Eduardo Cardozo (SP), aprovado no mês passado pela Câmara com parecer favorável do deputado Reginaldo Lopes (PT-MG).
A nova lei proíbe o cancelamento unilateral do contrato pela seguradora. Por outro lado, que o segurado não pode aumentar intencionalmente e de forma relevante o risco coberto pelo seguro, sob pena de perder a garantia.
Hoje existe apenas o entendimento da Justiça de que o cancelamento unilateral do contrato de seguro é abusivo.
Para evitar insegurança jurídica nos contratos, os riscos e os interesses excluídos da cobertura devem ser descritos de forma clara e de forma que não deixe dúvidas.
Se houver divergência entre a garantia delimitada no contrato e a prevista no modelo de contrato apresentado ao órgão fiscalizador competente pela seguradora, deverá prevalecer o texto mais favorável ao segurado.
Nulidades
Quando a seguradora cobrir diferentes interesses e riscos, os requisitos para cada um deles devem ser preenchidos em separado para que a nulidade de um não afete os demais.
Além disso, o contrato será nulo se qualquer das partes souber, no momento de sua conclusão, que o risco é impossível ou já se realizou. A parte que assinar o contrato sabendo da impossibilidade ou da realização prévia do risco deverá pagar à outra o dobro do valor do prêmio.
Mudança do risco
Quando houver aumento do risco calculado inicialmente para a definição do prêmio a pagar e o aumento do prêmio recalculado for superior a 10%, o segurado poderá pedir a dissolução do contrato em 15 dias, a contar de quando ele souber da mudança de preço.
A eficácia da revogação, no entanto, contará desde o momento em que o estado de risco foi agravado.
Se nesse período ocorrer o sinistro (a destruição do patrimônio segurado, por exemplo), a seguradora só poderá se recusar a pagar a indenização se provar o nexo causal entre o agravamento do risco e o sinistro.
Por outro lado, se houver redução relevante do risco, o valor do prêmio será reduzido proporcionalmente, descontadas as despesas realizadas com a contratação.
Seguro de vida
A nova legislação revoga o trecho do Código Civil sobre seguro de vida e de danos, absorvendo regras já existentes e detalhando outras.
O proponente desse tipo de seguro poderá estipular livremente o valor, que poderá ser variável, tanto para o prêmio quanto para o capital em caso de sinistro.
O capital segurado devido em razão da morte do segurado continua não sendo considerado herança para nenhum efeito, e os planos de previdência complementar são equiparados a seguro de vida.
A indicação de beneficiário é livre, podendo ser alterada inclusive por declaração de última vontade do falecido. No entanto, se a seguradora não for informada a tempo da substituição, não responderá por erro se tiver pagado ao antigo beneficiário.
Se a seguradora, ao saber da morte do segurado, não identificar beneficiário ou dependente do segurado no prazo de três anos, o dinheiro será considerado abandonado e deverá ser depositado no Fundo Nacional para Calamidades Públicas, Proteção e Defesa Civil (Funcap).
Carência
O novo marco legal proíbe a exigência de prazo de carência nos casos de renovação ou substituição de contrato existente, ainda que seja de outra seguradora.
Em todo caso, o prazo de carência não poderá ser pactuado de forma a tornar inócua a garantia e não poderá ser maior que a metade da vigência do contrato, em geral de um ano.
Suicídio e doença preexistente
A lei continua permitindo a exclusão, nos seguros de vida, da garantia sobre sinistros cuja causa exclusiva ou principal decorra de doenças preexistentes. Essa exclusão, entretanto, só poderá ser alegada se não tiver sido pactuado um prazo de carência e desde que o segurado, depois de questionado, omitir a informação da preexistência da doença.
Se for convencionada a carência, a seguradora não poderá negar o pagamento do capital sob a alegação de doença preexistente.
O não recebimento de capital segurado por suicídio ocorrido dentro de dois anos da vigência do seguro de vida continua valendo. No entanto, se o ato ocorrer nesse período em razão de grave ameaça ou em legítima defesa de terceiro (para proteger outra pessoa, por exemplo) isso não será considerado para efeitos de carência.
A seguradora também não poderá negar o pagamento do capital segurado, ainda que previsto contratualmente, quando:
- a morte ou incapacidade decorrer do trabalho;
- da prestação de serviços militares;
- de atos humanitários;
- da utilização de meio de transporte arriscado; ou
- da prática desportiva.
Idosos
No caso de segurados mais idosos, a recusa de renovação após renovações sucessivas e automáticas por mais de dez anos deverá ser precedida de comunicação ao segurado com antecedência mínima de 90 dias.
Ao mesmo tempo, a companhia deverá ofertar outro seguro com garantia similar e preços atuarialmente repactuados, proibidas novas carências e o direito de recusa de prestação em virtude de fatos preexistentes.
A exceção será para o caso de a seguradora encerrar operações no ramo ou na modalidade.
Nos seguros de vida coletivos, a modificação dos termos do contrato em vigor que possa gerar efeitos contrários aos interesses dos segurados e beneficiários dependerá da concordância expressa de segurados que representem pelo menos 3/4 do grupo.
Seguro coletivo
Em relação ao seguro coletivo, disciplinado atualmente por resoluções da Superintendência de Seguros Privados (Susep), a nova lei só permite a atuação como estipulante (uma empresa, por exemplo) daquele que tiver vínculo anterior e não securitário com o grupo de pessoas em proveito do qual irá contratar o seguro. Fora dessa hipótese, o seguro será considerado individual.
Para que possam valer as exceções e as defesas da seguradora em razão das declarações prestadas para a formação do contrato, o documento de adesão ao seguro deverá ser preenchido pessoalmente pelos segurados ou beneficiários.
Interpretação
A nova lei determina ainda que o contrato de seguro deve ser interpretado e executado segundo a boa-fé. As divergências de interpretação deverão ser resolvidas no sentido mais favorável ao segurado, ao beneficiário ou ao terceiro prejudicado se relacionadas a quaisquer documentos elaborados pela seguradora, como peças publicitárias, impressos, instrumentos contratuais ou pré-contratuais.
Já as cláusulas sobre exclusão de riscos e prejuízos ou que impliquem limitação ou perda de direitos e garantias são de interpretação restritiva quanto à sua incidência e abrangência, e caberá à seguradora provar a existência de fatos que suportem essa interpretação.
Resseguro
Nas relações entre seguradoras e resseguradoras (empresas maiores que assumem com deságio parte do risco contratado pelo segurado), o texto permite que o pagamento ao segurado seja feito diretamente pela resseguradora, se a seguradora estiver insolvente.
Quanto às prestações de resseguro, adiantadas à seguradora para reforçar seu capital a fim de cumprir o contrato de seguro, elas deverão ser imediatamente utilizadas para o adiantamento ou pagamento da indenização ou do capital ao segurado, ao beneficiário ou ao terceiro prejudicado.
Salvados
A lei atribui obrigações também ao segurado perante a seguradora para evitar prejuízos a ela. Assim, o segurado deve, ao saber do sinistro (uma enchente, por exemplo) ou de sua iminência:
- tomar providências necessárias e úteis para evitar ou minorar os efeitos do sinistro;
- avisar prontamente a seguradora e seguir suas instruções para a contenção ou salvamento;
- prestar todas as informações de que disponha sobre o sinistro, suas causas e consequências, sempre que questionado a respeito pela seguradora.
Se descumprir de propósito esses deveres, o segurado poderá perder o direito à indenização ou ao capital pactuado, sem prejuízo da dívida de prêmio e da obrigação de ressarcir as despesas suportadas pela seguradora.
Se descumprir esses deveres sem intenção, perderá apenas o direito à indenização do valor equivalente aos danos provocados pela omissão.
Isso não se aplica se o interessado provar que a seguradora tomou ciência do sinistro e das informações por outros meios oportunamente.
Essas providências não serão exigidas se, para sua execução, colocarem em perigo interesses relevantes do segurado, do beneficiário ou de terceiros ou se implicarem sacrifício acima do razoável.
As despesas com as medidas de contenção ou salvamento para evitar o sinistro iminente ou atenuar seus efeitos serão reembolsadas pela seguradora até o limite pactuado entre as partes, limitado a 20% da indenização máxima se não pactuado.
A obrigação de indenizar prevalece ainda que os prejuízos não superem o valor da franquia contratada ou que as medidas de contenção ou salvamento tenham sido ineficazes.
E, em relação às medidas de contenção ou salvamento que a seguradora recomendar expressamente para o caso específico, ela deverá reembolsar a totalidade das despesas efetuadas, mesmo se ultrapassarem o limite pactuado.
Pagamento do sinistro
Em contratos com previsão de pagamentos parciais de indenização, a seguradora terá 30 dias para realizá-los após apurar a existência de sinistro e de quantias parciais a pagar.
Depois do recolhimento de documentos e de outros elementos, a seguradora terá 30 dias para se manifestar sobre a cobertura solicitada, sob pena de perder o direito de recusar.
A Susep poderá fixar prazo maior, limitado a 120 dias, para tipos de seguro em que a verificação da existência de cobertura for mais complexa.
Dentro do prazo poderão ser solicitados documentos complementares, o que suspende sua contagem por duas vezes, no máximo, retomando-se a contagem no primeiro dia útil seguinte ao de atendimento da solicitação.
A exceção será para as coberturas de veículos automotores e para seguros com importância segurada de até 500 vezes o salário mínimo vigente. Nesses casos, será possível suspender apenas uma vez.
Já a recusa de pagar a indenização coberta pelo seguro deverá ser expressa e motivada. Se não tomar conhecimento de fato que desconhecia anteriormente, a seguradora não poderá mudar o argumento depois da recusa.
Os prazos, suspensões e pedidos de documentação adicional se repetem após reconhecida a cobertura no processo de liberação do pagamento, incluindo-se os seguros de vida entre aqueles com apenas uma suspensão.
Prescrição
O prazo de prescrição de um ano, previsto atualmente no Código Civil, continua valendo para a maior parte dos casos, como cobrança de prêmio pela seguradora, cobrança de comissões por corretores de seguro ou as pretensões entre seguradoras e resseguradoras.
Será de um ano também o prazo para o segurado entrar na Justiça exigindo indenização, capital, reserva matemática, prestações vencidas de rendas temporárias ou vitalícias e restituição de prêmio. Nesse caso, o prazo conta a partir do momento em que souber da recusa da seguradora.
Por outro lado, aumenta para três anos, contados do fato gerador, o prazo para os beneficiários ou terceiros prejudicados exigirem da seguradora indenização, capital, reserva matemática e prestações vencidas de rendas temporárias ou vitalícias.